terça-feira, 17 de novembro de 2009

Aceitando as diferenças.


Sexta-feira, 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, em memória de Zumbi, quem sabe o primeiro grande revolucionário americano. Pois, Zumbi e o rei Ganga-Zumba comandaram o grande Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, em Alagoas, com quase 200 Km de extensão, e várias pequenas cidades. Foi, sem dúvidas, a primeira experiência republicana das Américas. E, ao contrário do que se pensa, lá não havia somente um “bando de escravos fujões”, mas gente pobre de todos os matizes, uma população de 30 mil pessoas, eram negros, brancos e índios, agricultores e artesãos fugindo todos da opressão feudal e da pobreza das cidades portuguesas. Uma sociedade de iguais, apesar das diferenças. É, pois, uma data para se ir além desta celebração da etnia negra. É, sim, a oportunidade para rever conceitos e preconceitos que, no Brasil, teimamos em esconder.

Confesso que houve tempo em que pensei que deveríamos recusar as diferenças, a fim de construirmos uma sociedade igualitária. Reconheço, hoje, que são justamente as diferenças que compõem a beleza da raça humana. Estar em paz com as diferenças é aceitar que o mundo tem mesmo de ser multicolorido e multicultural. Nós é que devemos nos adaptar a todos os desiguais. Só o que não se deve aceitar é a falta de caráter e a não aceitação das diferenças, o que nos leva ao tratamento discriminatório a todos os que não aceitamos como “nossos iguais”. Não existe uma raça negra ou uma raça branca ou uma raça amarela, somos todos da raça humana. Cada um de nós, sobre a face da Terra, é tão diferente geneticamente um do outro, que até nisso somos iguais. Ainda assim, discriminamos as etnias, as mulheres, as crianças, os homossexuais, os velhos, os magros, os gordos.

Os verdadeiros valores não estão na cor da pele, na ideologia política, no sexo, na idade, na religião, na opção sexual ou no gosto de cada um por “jazz” ou samba. O caráter, sim, é o importante, a lealdade, a honestidade, o respeito consigo mesmo e com os outros, uma sólida conduta ética e moral. Esses os verdadeiros valores, infelizmente, hoje, cada vez mais fora de moda, principalmente na atividade política, donde deveria vir o exemplo. Se já somos diferentes na cor da pele, na cultura, nos gostos, não podemos aceitar tratamentos diferentes em respeito aos direitos fundamentais e igualdade de condições de acesso aos benefícios sociais. Oxalá, um dia tenhamos uma verdadeira República, talvez nos moldes da que foi sonhada por Zumbi dos Palmares, há trezentos anos. Pensem nisso.


terça-feira, 10 de novembro de 2009

Pelo fim do mau humor.


Pois bem, vamos reconhecer que todo mundo tem o direito de, algum dia, amanhecer azedo e sem vontade de ver a cara de ninguém. Acontece, à vezes. A vida moderna, o estresse, as dívidas, a política, o seu time de futebol, mas para tudo há limite. Vejam só: de manhã cedo, primeira hora de trabalho, o sujeito cumprimenta o companheiro: “Bom Dia!”, o outro dá um grunhido rouco; o primeiro pergunta: “Que mal humor é esse?”, resposta: “Você é dentista por acaso, para eu ter de mostrar os dentes”. Credo! A história é real, eu vi e ouvi. Pois, um carrancudo e mal humorado desses vai envelhecer mais cedo, além de dar mostras de ser um tremendo mal educado: a um “Bom dia” se deve responder com outro, sempre. Mesmo que sua mãe tenha morrido ontem, nunca perca a oportunidade de ser educado. O mundo ao nosso redor não tem culpa dos nossos dramas, passar para os outros nosso azedume é falta de maturidade.

Gente azeda é insensível aos outros e quer contaminar a todos com sua carranca. Já viram como é bom estar ao lado de uma pessoa alegre e educada? Gente assim é que te eleva o astral. Conheço pessoas que têm medo de mostrarem-se educadas e alegres por receio de serem tidas como fúteis. Ora, você pode ser sério com bom humor, além do que, cara feia não é indicativo de sobriedade. Na verdade, não há quem não se sinta bem ao lado de uma pessoa educada e de bom humor, desde que não haja exagero. Não é preciso andar por aí rindo à toa feito o “bobo da aldeia”. Use de gentileza sempre que puder, descubra o prazer de ser educado, de ser útil, de fazer pequenos favores sem esperar nada em troca. Descubra os “invisíveis”, aqueles por quem você passa e não nota a presença. Dê um presente a um amigo sem que seja o aniversário dele. Se alguém quiser desabafar, escute. Aliás, busque escutar sempre mais do que falar, é por isso que temos dois ouvidos e uma só boca.

O quê? Você não tem tempo para isso? Isso é conversa mole sua! Ninguém perde tempo na solidariedade. Por um instante, esqueça-se dos seus próprios dramas e seja solidário com o drama alheio. Descubra que todas as pessoas e todas as coisas têm sua importância. Sua vida vai melhorar? Quem pode saber? Isso só depende de você, mas acredite, você vai se sentir imensamente bem. Por isso, se alguém lhe desejar um bom dia, responda educadamente, de bom humor, com um sorriso na cara: “Bom dia para você também!”

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Água mole em pedra dura.



Como é dura, às vezes, a vida do cronista. Incompreendido, é tido por cansativo e repetitivo pelo leitor. Eu sei, amigos leitores (acredito que ainda os tenha), que escrevemos, repetimos, batemos na mesma tecla, vezes sem conta. Mas, é para que não morra em nós, os cronistas, a indignação diante das abominações que ferem a nossa dignidade (agora é “nós”, a sociedade). Essa é a maneira que encontramos de levar ao público os fatos que imploram apuração e soluções, em respeito aos homens de bem. É a teoria da “água mole em pedra dura”, é preciso insistir e insistir. As pessoas não mudam, é por isso que as coisas não mudam.

Vejam só: todos os anos, os escândalos na política se repetem. E quem são os políticos causadores dos escândalos? Sempre os mesmos. Raramente são uns novos. Então, porque continuamos a votar neles? De quem é a culpa, senão do eleitor, é claro! Pois é o eleitor quem não muda! Por isso batemos na mesma tecla. Para que o povo aprenda que não é vítima. Numa democracia (acreditamos que o Brasil ainda o seja), quem manda é o povo. Aprenda, pois, a mandar!

A educação, então, é sempre deficiente, em qualquer região, com escolas em estado lastimável, às vezes, são até containeres de lata; falta de transporte e merenda, alunos indisciplinados, professores mal remunerados e, no mais das vezes, desinteressados da educação e interessados em política partidária. É preciso repetir: só a educação salva o Brasil. Sem educação seremos sempre um país em desenvolvimento, esqueçam a entrada no primeiro mundo.

Vejam só o trânsito: no Brasil morre, por ano, mais gente do que morreram americanos no Vietnã. A frouxidão e a impunidade são as responsáveis pelo caos. Um bêbado pode se recusar a fazer o teste do bafômetro. Ora, é o interesse privado sobrepondo-se ao público, e isso é absurdo. O excesso de velocidade e a ultrapassagem proibida são infrações, quando deveriam ser crimes, porque matam, e muito. Como não continuar falando sobre isso?

A lei é igual para todos (dizem)! Mas, parece que uns são mais iguais que outros, e se beneficiam com a impunidade. Como não continuar falando da falta de ética na classe política? Pois se essa falta de moralidade pública se reflete no povo, “ora, se eles podem porque eu não?”. Vem daí a falta de respeito às instituições, aos velhos, aos professores, aos pais, às leis, ao trânsito, aos animais, às diferenças, enfim.

É, por isso, amigo leitor, que o cronista precisa continuar batendo assuntos velhos, mesmo que seja como escrever na areia, não importa o tempo que leve, pois uma ou duas cabeças podem mudar para melhor, e, quem sabe, não acabem contaminando outras com o vírus da ética e da moral.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Condenados à liberdade.

O passado é imutável, inexorável, nada que se faça vai trazê-lo de volta ou mudar qualquer evento passado. No entanto, o passado não existe mais; passou, já era! E o futuro? Como será? Ora, quem é que vai saber? O futuro ainda não existe, está sendo construído agora. Previsão significa ver antecipadamente, mas não pode haver previsão porque posso construir, agora, um futuro diferente do previsível. Assim, existe só o presente, sempre, num ato contínuo de existir e realizar agora o que vai acontecer amanhã.

Não existe destino, nem predestinação, não existe fatalismo, nada está escrito nas estrelas; isso é desculpa de acomodados. O acomodado é aquele que diz: “Deixa assim, seja o que Deus quiser, não posso mudar nada mesmo, nada faz diferença”. Oh, imobilismo! Quem disse que Deus quer as coisas assim? “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Ora, somos seres dotados de livre-arbítrio, os acontecimentos das nossas vidas são fruto do exercício da nossa vontade, não por determinação de Deus, tampouco, são frutos do acaso. É sempre muito fácil colocar a culpa das minhas falhas como homem ou cidadão nas mãos do Criador. Daí é que nascem o conformismo, a preguiça, a letargia. O máximo dos sofismas: “Ué! Deixa que Deus resolva. Ele não sabe de tudo? Então por que não impediu que tal coisa acontecesse?” Simplesmente porque deixa a nossa vontade livre, para que haja mérito nas nossas vitórias. Estes conceitos teológicos têm de ser revistos. Pelo pouco que entendo de Deus, somos seus filhos e não marionetes. A história, pois, está em construção, logo posso interferir no meu futuro. Toda a miséria, a dor, a fome e o desespero de milhões de seres humanos sobre a face da Terra, não pode ser da vontade de Deus. Há de ser fruto do orgulho e da cobiça do próprio homem.

Jean-Paul Sartre disse que “... o homem está condenado à liberdade”. Essa condenação da qual o filósofo nos fala é: somos livres para agir, no entanto, somos responsáveis por tudo o que fizermos. Liberdade sem responsabilidade não é liberdade, é libertinagem. Temos, pois, a liberdade de escolhermos como vamos viver, mas se a semeadura é livre, a colheita é obrigatória. Nós construímos a estrada por onde vamos caminhar, somos os arquitetos da nossa felicidade e os culpados pela nossa danação. Não se vá botar a culpa em Deus por isso.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

O que importa realmente?


Li, recentemente, num desses cadernos de saúde encartados num jornal, que a manutenção de uma rotina nos leva a uma melhor qualidade de vida. Certo! Tudo bem! É bom mesmo cumprir com as obrigações, quer profissionais ou sociais, mesmo que essas sejam rotineiras. Mas, quanto dessa rotina não fazemos uma mania e um hábito? Temos mesmo que fazer as coisas repetidamente todos os dias, por anos a fio? Qual a diferença entre o importante e o urgente? E se eu simplesmente nunca mais fizesse uma dessas coisas? Você aí, amigo leitor ou leitora, pode tirar uns dias de folga para não fazer nada, só para variar? Pode mesmo largar tudo para trás? Por que não faz isso, então? Medo de mudar, né? O que é, afinal, importante na sua vida? Ora, nossa educação sempre foi no sentido de estudar para sermos grandes homens, ter bons empregos, ganhar muito dinheiro, ser um político, talvez. Queremos mesmo isso? É esse o objetivo da sua vida? A sua meta, o seu sonho? É por isso que você sai da cama todos os dias? Dinheiro? Bom emprego? Jura que é isso? Ah, fala sério! Será que vale mesmo à pena? Você tem consciência do que está fazendo e do que realmente quer? Ou será que você faz o que faz porque não tem coragem para enfrentar um possível fracasso e por isso deixa de lado seus verdadeiros sonhos? Ah, o que os outros vão pensar, não é mesmo? O que importa realmente para você? Estar satisfeito com a vida ou parecer satisfeito na vida? Porque se for isso, amigo - só uma vida de aparências - pode esquecer os seus planos de felicidade. Porque só a verdade pode servir de base para uma vida plena e feliz. Seu sonho pode ser atravessar a América numa motocicleta ou salvar as baleias, quem sabe contar historinhas para crianças doentes, cuidar de velhinhos num asilo, montar uma biblioteca comunitária ou estudar geologia, veja só! – não sei de nada, o sonho é seu – mas sei que com a bunda colada numa cadeira de escritório ou na frente da televisão, você não vai realizar nada desse seu sonho aí. É preciso começar a trabalhar já no sentido de realizar algo que valha mesmo à pena, porque a velhice chega e aí pode ser tarde demais. Não que isso signifique abandonar o trabalho e o dinheiro, afinal, lembre-se do que dizem os especialistas: que a rotina faz bem à saúde (e ao bolso); mas, dê a si mesmo pequenos momentos de satisfação com aquilo que importa realmente na sua vida. Talvez você não consiga realizar o seu sonho, mas pelo menos tentou; e, no momento da tentativa, sua vida teve outro sabor, você teve o controle de si mesmo, fez aquilo que queria, decidiu seu caminho. Foi livre, afinal.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

La negra.



Yo tengo tantos hermanos
Que no los puedo contar
En el valle, la montaña,
En la pampa y en el mar”.

Esses versos do Athaualpa Yupanqui, na voz macia de “la negra”, retumbam sempre no meu pensamento. Lembranças da juventude idealista, sonhadora talvez, vivenciando a platônica idéia de uma real fraternidade latino-americana. Mercedes Sosa morreu. Calou-se a voz da “cantante del pueblo” de fortes posições políticas. A música que era hino dos nossos sonhos está silente. O vento que embalava nossas bandeiras não sopra mais. Conheci Mercedes Sosa em 1976, através da música Volver a los 17, gravada em parceria com o Milton Nascimento, no álbum “Geraes”. Era um rasgo de felicidade ouvir “la negra”. Escutei, depois, sua voz ao lado de Dante Ledesma, Fagner, Caetano Veloso e entre outros mais. A poesia pungente, encantadora e engajada de Neruda, Yupanqui e Violeta Parra fazia a nossa cabeça juvenil dar voltas ao redor da América Latina, e com ela consertávamos aquele nosso mundo abaixo do Equador, sempre mergulhado nas estúpidas ditaduras. Ai, dura perda! Foram-se Elis, o Henfil, o maestro Tom Jobim, o Noel Guarany e, agora, a Mercedes. O Chico já não encanta, o Gil desistiu da política, o Caetano foi para o cinema. O que restou? A América do sul ficou mais pobre. As ditaduras se foram, é verdade, mas as esquerdas que assumiram ainda têm o ranço das ideologias ultrapassadas, com aquela velha vontade de perpetuação no poder. Nenhum Bolívar, nenhum San Martín, são dirigentes primários e lineares, são apenas populistas, sem a inteligência de um Vargas ou Péron, mas trocando favores do Estado pelo voto. “ La negra” cantou a alegria simples dos simples, cantou a saudade, o amor, o trabalho, a solidão, um mundo sem fronteiras e sem bandeiras. Os jornais estão errados, não morreu uma cantora argentina. Perdoem-me os hermanos, mas Mercedes Sosa era uma voz patrimônio de toda a América Latina. Quando chorou com as mães na Plaza de Mayo, acho que chorou por todas as mães em todas as praças do mundo. Obrigado, Mercedez, valeu à pena, Gracias à la vida!

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Respeito é bom.

Os relacionamentos humanos, notadamente os relacionamentos conjugais, mostram-se cada vez mais espinhentos, e estão baseados na dificuldade de se entender que não podemos ser felizes com os outros se não o formos conosco mesmos. No momento em que entendemos isso, tudo fica fácil e simples. Ainda seguimos os princípios de que para haver perfeito entendimento num relacionamento alguém tem que ceder. Seja isso no casamento, pais e filhos, patrão e empregado, professor e aluno, dupla caipira, etc. Por quê? Ah, esse tempo já passou! Toda a vez que alguém cede, este alguém perde. Isso significa prejuízo, e ninguém é feliz sofrendo algum prejuízo. Claro, existem relações de hierarquia como patrão e empregado, que nesse caso não significa ceder e sim obedecer ao poder de mando que é natural neste contrato social. Falamos da vida de relação que implica sociedade, cumplicidade e afetividade. O respeito às diferenças, à alteridade, é o instrumento mais construtivo num relacionamento. Se você, um dia, chegar a ofender, que seja com um palavrão, sua esposa, seu esposo, ou seu filho, ou seu aluno, ou seu sócio, ou mesmo o seu parceiro de dupla sertaneja, perderá o respeito dele. Ofensa física, então... Mesmo que ele viva com você, de cabeça baixa, o resto de suas vidas, não lhe respeitará nunca mais. Respeito é bom e todos gostam. Mania essa que nós temos de criar dificuldades com as coisas mais simples. Podemos viver muito bem com os outros sem precisarmos ser os donos da bola ou do campinho (essa é para quem já jogou bola em terreno baldio); ao contrário, estabelecemos regras, restrições, imposição da nossa vontade, como se os outros não existissem, ou não tivessem vontade. Não dá para ser feliz. Viver não é fácil, é verdade! Uma vida de relação é ainda mais difícil. No entanto, é preciso aprender a negociar e não apenas ceder, mutilando a própria vontade. Ceder constantemente significa desaparecer da relação, triste, infeliz e sem vontade, e quando um desaparece só resta o outro, e isto não é mais relação. Tá certo! Muita gente vai dizer piscando os olhinhos: isso é prova de amor. Uma ova que é! Isso é só submissão, coisa de paixão. E paixão dá e passa. Paixão acaba quando as rugas e as dificuldades aparecem. O amor, ao contrário, se fortalece na cumplicidade, na mansidão do afeto, nas adversidades e, sobretudo, no respeito ao outro. Ame, pois, sem paixão, respeite para ser respeitado, e vá ser feliz. Pensem nisso!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Caminhos.



Não quero a Verdade só pra crer


Quero sabê-la na profundidade.


E será una comigo porque a posso ter


Deste momento para a eternidade.



Queres crescer?


Também quero!


Pois, vem comigo atrás da Verdade.



Eu disse a Verdade, não a tua, não a minha,


Que essas não importam, são falsas,


Que brilham e fascinam como pirita,


O ouro que só aos tolos encanta.



Mas, se vieres comigo,


Não olhes para trás,


Assim, vais perder o caminho.


Dá um passo à frente e já não estás no mesmo lugar.



Nunca mais pisarás este chão,


E caminhos novos não há.


É o caminhar que traça caminhos


Até onde a Verdade está.





terça-feira, 21 de julho de 2009

Sou o que sou...


Cada um de nós é o que é e, daquilo que se é, dá-se o quanto se tem. Não há como fugir dessa regra, não há exceção. Somos o que somos, somos o que nascemos para ser e não o que outros desejam que sejamos. Não conseguimos enganar ninguém por muito tempo. Um lobo será sempre um lobo e, mesmo domesticado, um dia sentirá falta do gosto da caça e vai uivar para a lua. No momento em que nos tornamos o que os outros querem que sejamos, não vamos deixar de ser o que somos, mas já não seremos mais integralmente nós mesmos, uma vez que mutilamos nossa natureza, sufocamos aptidões, reprimimos idéias e sonhos, dons são desperdiçados e restam planos que acabam esquecidos. É como criar e viver numa mentira, a verdade escondida é uma angústia que nos persegue. De repente, num descuido, a verdade teimosa vai aparecer e a dor será maior. Pais ainda existem que forçam, ou subornam, seus filhos a tornarem-se o que eles, os pais, desejavam para si próprios. E é aí que aparecem os maus advogados que seriam bons engenheiros, os maus médicos que seriam bons advogados, os maus engenheiros que seriam bons marceneiros. E aquilo que queríamos realmente ter sido nos persegue como sombra, sempre a nos lembrar que poderíamos ter sido um pouco mais senhores da nossa vontade. Em quantos casais um dos dois desaparece como pessoa para que o outro possa crescer? Pois, isso não é altruísmo, não é amor, é só submissão. O resultado, quase sempre, são vidas amargas, ressentidas, deprimidas e complexadas. Outra coisa, ainda, é buscar um modelo e tentar copiá-lo. Quase sempre a cópia acaba mal feita. Pois, cada um tem o seu jeito de ser, e é sempre melhor agir naturalmente, de acordo com esse seu jeito, a sair por aí feito uma fotocópia de má qualidade. Por conta disso, os consultórios dos analistas estão cheios. O sujeito anda tão longe de si, com os trejeitos, maneiras e aparências dos seus ícones e ídolos, que sufoca a si mesmo e acaba ainda mais infeliz. E depois: meta-lhe antidepressivo e meta-lhe ansiolítico. Pois, o caminho da felicidade passa obrigatoriamente pelo autoconhecimento, o “conhece-te a ti mesmo” de Sócrates, sempre tão atual. Isso funciona como um espelho, mire-se nele, descubra-se, valorize suas virtudes, sufoque os seus vícios morais. Só assim, é possível ter pulso firme e gerenciar a própria vida, sendo aquilo que somos e o que devemos ser, não uma mentira mal contada, que já não engana ninguém. Talvez aí, comecemos a descobrir um jeito de ser mais felizes conosco mesmos e com o mundo.

terça-feira, 30 de junho de 2009

Uma questão de fé.


Houve um tempo em que acreditei que as “religiões-instituições” - não a religiosidade - poderiam salvar os homens e o mundo. As religiões com suas hierarquias, seus dogmas descabidos, suas formalidades exteriores, suas prerrogativas políticas, seus homens e mulheres vaidosos e a sua fé cega fizeram-me um cético. Hoje agradeço muito por isso. Deus não tem nada a ver com a suntuosidade dos templos, com os rituais medievais, com os ricos paramentos e com as interpretações estapafúrdias e individualistas da Bíblia, da Tora, do Corão, etc. São os homens que devem erguer os templos em seus corações, são os homens que devem caminhar para Deus. Isso é religiosidade. Só a melhora do homem, feita por si mesmo, pode salvar o homem e o mundo. Houve tempo em que acreditei em fé como um sentimento humano que move os atos de Deus. Nunca funcionou comigo. Estupidamente fui ensinado a temer a Deus, eu me borrava imaginado a “face irada” de Deus, o “olhar severo” de Deus, imaginem o tamanho da “mão de Deus”. Quando criança, tentei mover uma pedra com a força do pensamento, carregando esse pensamento com toda a fé que eu tinha; resultado: não movi nem um grão de areia. E olha que eu estava treinando para mover uma montanha. Acho que eu não era uma criança muito inteligente, acabei acreditando que eu tinha algum defeito em matéria de fé. Mas, então, eu cresci, e, como adulto cético que eu já era, conheci outra concepção para a fé: o conhecimento que gera confiança, certeza e serenidade. Descobri que a fé, hoje serena, precisava nascer da dúvida que impulsiona e não da fé cega, do “acredita ou morre” que gera mais incertezas e materialismos que confiança. O ceticismo me leva a questionar, a tentar descobrir as causas de tudo, a raciocinar com o uso da lógica e da razão; e, ao descobrir os porquês, eu tenho o conhecimento que gera confiança e serenidade, enfim, uma fé inabalável porque não nasceu da crendice e da superstição. O objeto da fé não precisa ser visto, basta que se saiba da existência dele. O sol existe, eu sei disso sem precisar de fé. Mas, tenho “fé-certeza-confiança” serena que amanhã ele vai brilhar novamente. Hoje não me perturbo mais em saber se posso ou não mover montanhas. Descobri que a maior montanha é a minha própria ignorância. Hoje não temo mais a Deus, Ele não tem mais uma face irada, pois descobri que Ele é a Soberana Justiça, e isso basta. Minha fé é hoje do tamanho de um grão de mostarda, e quero construir o Reino de Deus em mim dia-a-dia com a confiança de quem aprende e a serenidade de quem sabe.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

“Vida louca, vida..., vida breve”.


             Vida louca, vida..., vida breve; já que eu não posso te levar, quero que você me leve”. Esses versos do Lobão, na voz do Cazuza, me vieram à lembrança quando vi uma certa reportagem num desses programetes sensacionalistas da TV. Pois, tragédias como essa queda do airbus da Air France tem um poder de comoção que outros eventos igualmente trágicos não têm. Centenas de pessoas morrem no trânsito diariamente, por exemplo, mas isso já não nos comove, banalizamos. Já um avião... Talvez seja porque é muita gente junta a morrer ou, talvez, porque isso reforça o medo que, lá no fundo, todo mundo tem de voar. Então, vem a tal reportagem, de tremendo mau gosto: tinha gente comemorando, isso mesmo, comemorando, por que não havia conseguido, sei lá por que cargas d’água, embarcar no fatídico vôo. Ora, deve ser uma sensação maravilhosa saber que você não entrou num avião que estava prestes a cair. No entanto, dar um  depoimento celebrando isso, e dizendo-se “abençoado” por Deus, é um desrespeito com as famílias das outras centenas de pessoas que morreram. Parece algo assim: Deus, que de justo não teria nada, prefere uns a outros dos ditos filhos seus. É cruel pensar assim. É injusto com Deus pensar assim. Só mostra ignorância e egoísmo. Acho que uma hora dessas é para se refletir sobre a efemeridade da vida, aliás, todos deveríamos ter plena consciência do quanto a vida é efêmera. Com certeza, viveríamos melhor. Cientes da brevidade de tudo o que vive, talvez, até no trânsito, que mata mais, seríamos mais respeitosos. Não seríamos tão arrogantes, autossufientes, orgulhosos e prepotentes. Entenderíamos que somos todos iguais, pois a única fatalidade a que estamos sujeitos é o túmulo, cedo ou tarde. O importante é viver. E não é o “quanto” se vive, mas o “como” se vive o que importa mais. E viver é aproveitar os momentos com aquilo que há de mais precioso, as pessoas a quem amamos, que também são efêmeras. Sim, precisamos ter a consciência de que tudo o que mais amamos um dia vai desaparecer, é a lei imutável do Universo. Não há injustiça nisso, há sabedoria, pois é igual para todos. Devemos celebrar a vida, e não lamentar a morte, por que a vida é sagrada e só por isso deve ser tão apreciada.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Somos nós que mandamos.


            Caros amigos, o explorador inglês, Sir James Clark Ross, disse uma frase que me pôs a pensar: “Um político pensa na próxima eleição; um estadista, na próxima geração”. Acho, por isso, que o Brasil não tem mais estadistas. Há algum tempo, também, ouvimos dizer que o Congresso atual é o pior Congresso que o Brasil já teve o desprazer de abrigar. Também concordo. Aturamos uma escória política que nos envergonha. E levaremos décadas para corrigir essa nódoa. A “Geni” do momento é o Senado, com seu vergonhoso loteamento de funções de diretoria, farra das passagens aéreas com nosso dinheiro, uso indevido de residências, e por aí segue o lixo. E os nossos senadores? Não sabiam nada? Só o Simom, com sua pose de moralista, tem um “século” lá dentro. E quem é esse outro sujeito que temos de aturar, o tal Deputado Sérgio “tô me lixando” Moraes? Saiu daqui, ó, deste rio-grande “politizado”. “Estou me lixando para a opinião pública. Até porque a opinião pública não acredita no que vocês escrevem. Nós nos reelegemos mesmo assim.” Assim eles pensam. E o pior..., têm razão. Nas próximas eleições, serão os mesmos..., de novo. E não adianta o Zé Povo chorar. Pois, é aí que reside o nosso paradoxo social. Como sociedade somos cidadãos. E como tal somos responsáveis pelos políticos que temos. Esse é o grande barato da democracia. Mas, o que nos falta enquanto cidadãos é cultura, educação e consciência política. Não temos a menor idéia do que é ser um político a serviço do povo, do quanto ele nos deve obrigação sobre o que faz com o seu mandato. Ora, somos nós que mandamos. Temos o poder da escolha. “Ah, não gostei de ninguém!”, tudo bem! Vote em branco, vote nulo.  Não se deve escolher alguém só por que ele é o “menos ruim”. Assim, nunca sairemos da condição de analfabetos políticos. Nunca seremos cidadãos de verdade enquanto não nos respeitarmos como cidadãos e não como meros portadores de carteira de identidade. Nunca seremos um país desenvolvido enquanto formos pobres. E não deixaremos de ser pobres enquanto nosso povo for inculto. E cultura e educação devem vir sempre antes do ensino.

 Pensem nisso.

sexta-feira, 20 de março de 2009

De avô para neto...


           Aqui vai este recado, de avô para neto, e que ninguém mais nos ouça, meu pequenino. Tu acabas de chegar e, por certo, não estranhas nada, pois que de nada sabes ainda. Mas, este teu avô precisa dizer-te umas coisas. Primeiro: nunca tenhas a pretensão de ter todas as respostas, pois a vida vai trazer-te sempre novas perguntas. Segundo: a vida tem cá seus vícios, mas vicia-te só no bem. E mais: tenha um aperto de mão forte, olhe sempre nos olhos, agradeça sempre e, quando possível, tenha um cão. Não quero falar-te sobre as ciências e tecnologias do mundo, isso vais conhecer a seu tempo, quando conseguires alcançar um teclado. E serás bem melhor que eu, te garanto. Tampouco conversaremos sobre os astros, sobre os turbilhões de galáxias e as infinitudes do Universo ou sobre as muitas possibilidades quânticas, já que eu mesmo sei que nada sei sobre isso. Acho mesmo que essa nossa conversa será para quando estiveres pronto a filosofar, por que eu quero falar-te sobre o maior mistério da obra de Deus: o homem. Talvez, o muito a se dizer sobre nós, humanos, resuma-se em muito pouco: somos difíceis de entender. Vivemos numa grande nave espacial. É..., num mundo que nos foi emprestado pelo Criador. É..., eu sei..., também acho que deveríamos ser gratos, sim, mas tudo o que fazemos é estragar essa casa aos poucos. Somos tão estranhos... Acontecem, a nossa volta, grandes incêndios devoradores de casas e florestas, terremotos pavorosos, os níveis dos oceanos estão subindo por que as geleiras se desfazem, as nevascas matam no Norte e as tormentas matam no Sul, a África morre de fome e a América de obesidade, nós ainda fazemos guerras e as guerras continuam vitimando inocentes, existem muitos com pouco e poucos com muito... Ainda assim, nossa preocupação são os campeonatos de futebol. Em Deus, nós apenas acreditamos, quando seria melhor conhecê-Lo. Oramos nos templos implorando por milagres, mas fazemos pouco para ajudar-nos. O que pedimos a Deus? De tudo. Desde emprego até o fim da violência, como se isso dependesse de Deus e não de nós. Enfim, queremos a coisa que vem fácil e sem esforço, e ainda queremos negociar com Deus por isso. E nos esquecemos que o grande milagre já nos foi dado: a vida. O que nenhum homem é capaz de criar. De duas minúsculas células genésicas que se combinam, a vida cresce, do embrião ao feto, até vir à luz do mundo um novo ser humano. Assim como tu, meu pequenino, que acabas de chegar. Mas, escuta um segredo..., apesar de tudo, viver esta vida vale muito à pena! Sê bem-vindo!

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Pois é..., passou.


            Não sou tão velho, tenho só “cinqüenta” anos (gosto do trema, sim), mas, de repente, comecei a ficar assim, meio saudosista. Fui um guri (tinhoso, dizia minha mãe) de muitos brinquedos: as árvores no quintal, o jogo do taco no meio da rua, campinhos de futebol onde ficava até escurecer, as pandorgas (que agora dizem: pipa) e  as bolas de gude (ah, as minhas “bulitas”) jogadas no terreiro sempre limpo e varrido onde eu também jogava pião, meu rifle “Winchester” era um galho. Usava guarda-pó branco na escola, onde, uma vez por semana, cantávamos o Hino Nacional. Sabia tabuada de cor e faço contas de cabeça até hoje. Conhecia todos os vizinhos da rua e todos diziam: bom dia, por favor, obrigado. Nossas casas tinham cercas de sarrafos e quando roubavam alguma coisa de alguém, era um escândalo comentado por dias. Nós fazíamos as refeições juntos e conversávamos à mesa. A mãe educava e o pai era figura presente e forte, mesmo sendo quase analfabetos isso não importava, afinal, eram o pai e a mãe. A televisão tinha que esquentar as válvulas antes de aparecer a imagem da “Família Trapo” ou dos “Perdidos no Espaço”. Geladeira era coisa rara e o telefone um luxo de classe média. Pois é..., passou. Hoje, as crianças andam com um MP-4 atolado no ouvido ou trancadas no quarto com seus computadores. Não ouvem ninguém, não sabem jogar bola, não sabem nem correr, odeiam sol e adoram um ar-condicionado. O computador comanda suas vidas, só se relacionam pelo Orkut e pelo MSN, não sabem conversar e gostam de viver uma vida virtual, inventada pela máquina e nela vivida. Fora do quarto, a vida é perigosa e tediosa. Talvez, por isso, tantos jovens adultos não sabem resolver seus problemas e temem deixar o lar paterno. Ir à escola é um sacrifício sempre compensado pelos pais ausentes. Os professores são os chatos que insistem que todos leiam ou aprendam a pensar, mas que infelizmente não podem ser deletados ou ignorados como no mundo virtual. Não há necessidade de pensar, basta agilidade para teclar e habilidade para dominar todas as ferramentas. Tentamos, a Zildinha e eu, educar nossos filhos nos padrões da nossa educação. Porém, permitindo o uso das novas tecnologias e ações virtuais, mas sem descuidar para que interagissem com o mundo verdadeiro, ou seja, subindo nas árvores, jogando bola, brincando de correr e sendo educados com os outros. Acho que conseguimos. Os filhos já são adultos e vivem as suas vidas, mas sempre que nos encontramos todos, comemos juntos e, sobretudo, conversamos. Penso que os pais precisam retomar a responsabilidade da educação dos filhos e buscar viver uma vida mais simples, onde o “ser” é preferível ao “ter”. Talvez aí, possamos ser menos arredios ao convívio social, indiferentes e despreparados para a vida. Pensem nisso.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

A frieza do relógio.




Raul Seixas cantava: “... a frieza do relógio não compete c’oa quentura do meu coração...”; tinha razão, não compete mesmo. O relógio frio marca o tempo que acabamos por fazer nosso inimigo. Aquele ponteirinho dos segundos é implacável; o tempo nos atropela, não pára para ninguém, a tudo consome; destrói as pretensões de onipotência da adolescência e, nos velhos, esvai o sonho da juventude eterna. Mas, se tempo é nosso inimigo, e se não podemos combatê-lo, por que não fazemos dele um aliado? Por que não aproveitar o que o tempo nos deixou de bom? Se o tempo é relativo, como ensina a física, a felicidade também é, como quer a filosofia. É preciso olhar para trás e não dar importância ao ruim, aprender com os maus momentos, buscando, porém, valorizar mais o bom e o belo. Felicidade é isso: o somatório de momentos felizes. Pois, a felicidade não é um lugar onde se deva chegar, e sim o jeito como se caminha até lá. Lembram-se daquela passagem evangélica que orienta a ajuntarem-se tesouros que a traça não corrói, que a ferrugem não consome e que o ladrão não rouba? Pois, os instantes de felicidade que estão no passado são as jóias deste tesouro que ninguém pode me tomar. Ora, se eu consigo fazer isso, guardar as coisas boas que passaram, o tempo será meu aliado, e eu serei menos amargurado, serei um sujeito mais grato, deixarei de ser o “maior sofredor do mundo” porque encontrei razões para celebrar a vida. Eu estarei sempre onde estiver meu coração. Outra coisa importante é esvaziar a agenda de coisas inúteis. Lógico, todo mundo sabe que viver é difícil e imprevisível, e muitas coisas não dependem de nós. Quanto às imposições da vida, é preciso ser adulto, encarando tudo de frente, pois não há o que se faça. Mas, não se pode viver só com obrigações a cumprir e problemas para resolver. Não é para isso que vivemos. A coisa toda é não fugir das responsabilidades como: contas a pagar, a profissão, os estudos, etc.; mas, é preciso marcar na agenda futura momentos que poderão trazer felicidade. Um tempo maior com a família, com as pessoas a quem amamos e que nos amam; um tempo para os amigos, que sempre estão lá, mas nós os negligenciamos – quem não tem amigos, que trate de fazê-los..., e logo – ou, quem sabe, um tempo de não fazer nada. O ócio abençoado e criativo. O certo é que se deve olhar o futuro sob a perspectiva de uma vida mais calma, sem expectativas demasiadas, sem sonhos, apenas com planos; uma vida mais humilde e mais simples, enxergando o tempo como dádiva e não um castigo. Aí sim, a frieza do relógio se aquece no coração. Então, não lamente o passado. Tudo é dádiva.

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