sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Eufemismos


Caros amigos, aqueles que estudam ou gostam da língua portuguesa (... lembram-se dela?) vão encontrar, entre as figuras de pensamento, um tal eufemismo que, como processo estilístico, consiste em atenuar uma idéia molesta, substituindo o termo contundente ou agressivo (sic) por circunlocuções menos desagradáveis ou termos mais polidos; ou seja, esse tal eufemismo serve mesmo é para dourar a pílula amarga. Pois, como figura de pensamento, é plenamente aceitável e deve ser usado, na escrita, na literatura, para evitar repetições, algo assim como um sinônimo mais educado; mas a banalização das nossas relações pessoais e a superficialidade como a sociedade encara essas relações botou o eufemismo na boca de todo mundo, está no dia-a-dia até da dona de casa que faz as compras no verdureiro. Estamos a um passo da discriminação e do preconceito mascarados pela polidez da palavra, pelo tal “politicamente correto”, criado pela sociedade norte-americana que, como todo mundo sabe, não é lá muito boa da cabeça.
Hoje, a empregada doméstica é “secretária do lar”, o cego é “deficiente visual”, o homem negro é “afro-descendente”, o gordo é “obeso” e o gordíssimo é “obeso mórbido” (... essa é boa!), o leproso é “hanseniano”, uma criança com retardamento mental é “excepcional”, ninguém mais morre, vai para o “andar de cima”, e por aí a coisa vai... É como se a profissão de alguém, a cor da pele ou qualquer disfunção ou deficiência física fosse um atributo imoral, uma coisa que só possa ser pronunciada à meia voz ou às escondidas.
Beiramos, sim, as raias da discriminação e do preconceito quando não temos capacidade de reconhecer valores morais e não somente criar distâncias entre as diferenças físicas e intelectuais. Criamos com isso, relações pessoais de mentira calcadas na superficialidade, no egoísmo e no preconceito gerando uma sociedade igualmente mentirosa, superficial e hipócrita. Daí o resultado de as nossas instituições serem carcomidas pela mentira que, filosoficamente, pode ser encarada como a “ausência da verdade”. Ou seja, faz-de-conta que somos um governo democrático, justo, honesto e preocupado com o bem estar social; e faz-de-conta que vocês são um povo ordeiro, honesto, trabalhador e cheio de civilidade. Você faz-de-conta que é verdade, eu faço de conta que acredito.
Falta-nos mesmo é coragem. Coragem para reconhecer que a nossa crise - seja ela individual ou coletiva - não é material, econômica, técnica ou institucional, a nossa crise é moral. Somos corajosos em apontar os defeitos dos outros, dos políticos, dos governantes; mas somos covardes para admitir que eles, “os defeituosos”, são frutos da mesma sociedade e que fomos nós que os colocamos no poder. Mas, para tudo há solução. É como nos diz o velho bordão popular: “Não gostou? Coma menos!”, ou seja, não vote mais em ninguém, ou aprenda a escolher melhor. O duro é saber quem é bom e quem não é, já que somos todos farinha do mesmo saco social. Opa, talvez eu devesse aqui usar de eufemismo: “... nos encontramos todos dentro dos mesmos padrões morais, e portanto não podemos discernir, e assim escolher, quem seja moralmente capacitado a nos dirigir, visto que a verdadeira autoridade, aquela que verdadeiramente respeitamos, é moral.”
Coragem! Pensem bem, é covardia nossa perdoar em nós aquilo que atacamos como defeito nos outros. Assim como as pessoas, um país não se torna bom da noite para o dia. A natureza não dá saltos, dizem os alquimistas. Quem sabe se a gente tentasse melhorar um pouco a cada dia? Usar de lealdade, sinceridade, olho no olho, menos eufemismos e mais altruísmo.
Pensem nisso!

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Anjo Colibri



Uma brisa de esperança
Sopra de leve aqui,
Ou será a asa de um anjo,
Um pequenino colibri?

“Esperança não sopra,
É substantivo abstrato!”
Corre em meu socorro
O sapientíssimo literato.

“Anjos são seres celestes
Que se chegam sem rumor”
Explica a teologia
Do santo abade prior.

“Um colibri esvoaça
Com seu bico de flor em flor”
Atesta a zoologia
Do graduado doutor.

Mas a brisa ainda é minha,
E sopra de leve aqui.
E me traz a esperança
Do meu anjo ser colibri.

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