Escrevo agora sobre o leite derramado, depois do jogo com cartas marcadas. O tribunal do júri do casal Nardoni, antes mesmo de começar, fazia dos dois a carne queimada da Inquisição. São culpados? Talvez sim. Eu, pelo menos, acredito que sim. O próprio promotor, Francisco Cembranelli, se disse em dúvidas, mas disse isso após o julgamento, é claro! Não existem provas, mas sim evidências. Porém, o clamor do povo foi tanto que jamais os dois escapariam da condenação, sob pena da cidade de São Paulo, ver-se às voltas com uma revolta popular. Particularmente, não tenho o menor interesse no destino dos Nardoni, se ficarão presos por vinte, trinta, quarenta anos, se vão apodrecer na cadeia, a mim pouco se me dá. Não quero avaliar o crime ou o julgamento. O que me impressiona é a violência, a fúria, a ignorância da turba, a grande massa manobrada pela imprensa. A imprensa “marrom”, que se delicia com crimes de morte, por que, afinal, tem assunto para vender jornal ou para audiência na TV. São os hipócritas que expõem e exploram a miséria humana, o sofrimento das famílias enlutadas e a memória de uma infeliz criança, morta por quem deveria lhe dar amor, educação e carinho. O desrespeito continua por semanas, meses, anos a fio, e a criança é repetidamente morta para a platéia, entre um terremoto e outro, entre um escândalo político e outro. E cada um do povo, cansado de ver triunfar a injustiça, a prepotência e a impunidade, vê a si próprio sendo vingado na figura da criança morta ou nos avós sofridos. Ninguém quer justiça, o que querem é o linchamento em praça pública, é a execução sumária dos réus. Olho por olho, dente por dente. E já!
Não se iludam, nós não somos um povo ordeiro e pacífico, somos a mesma plebe que os Césares, em Roma, aprenderam a controlar dando-lhe comida e o divertimento do circo de gladiadores. Panen et Circencis. Pão e Circo. Nosso pão, hoje, são os “vales” isso e aquilo, as “bolsas” disso e daquilo; o nosso circo aí está: na novela de sempre, com o mesmo e batido enredo, na “casa mais vigiada do Brasil” e que não acrescenta nada de bom nas nossas vidas e no sensacionalismo barato (quanto mais sangue melhor) com que a imprensa sobrevive. Em breve, teremos eleições. Não temos infraestrura, não temos saúde pública, não temos educação, não temos segurança, mas a diversão está garantida.
Parabéns pelo texto jovem Gerson,
ResponderExcluirPelo jeito a diva inspiração voltou a lhe soprar bons ventos. Grande abraço do amigo. ABC
Belo texto,como sempre centrado e coerente!
ResponderExcluirUm abraço: Leandro Souza.