sexta-feira, 3 de setembro de 2010

O Ovo da Serpente


O título deste artigo tomei de empréstimo do excelente filme de Ingmar Bergman que trata do horror da alvorada nazista ainda na República de Weimar. Trata-se de uma metáfora sobre a origem do mal que se vai instalando no tecido social. Conhece-se a origem, mas nada se faz para extirpá-lo, como esmagar o ovo antes que a serpente nasça. Assim a violência cresce ao nosso redor, atinge um nível de quase epidemia com absurdos índices de mortalidade. E nós? Estamos aí, vivendo a pasmaceira do egoísmo que nada vê ao seu redor, a não ser que a coisa seja conosco mesmos. Somente quando a violência atinge elevados índices de audiência na mídia, com casos pontuais de gente famosa, conseguimos dizer um “Oh! Que absurdo...!”, mas assim mesmo sem muita convicção. Isso porque convivemos com a violência e, insensíveis, não a percebemos mais. Não falo em crimes graves como assaltos e mortes e venda de drogas; aceitamos pacatamente as transgressões no trânsito; as agressões dentro das famílias; as atitudes anti-sociais dos que não respeitam filas em banco, em órgãos públicos, nos transportes coletivos; na exposição da infância à pornografia liberada, e à mostra, nas bancas de revista; daí se passa para o abuso sexual, violência psicológica e por aí vai. A causa dessa ruptura no tecido social não está só na impunidade, na falta de segurança pública, no desenvolvimento econômico precário ou na má distribuição de renda. Porque a causa determinante é intrínseca, está no comportamento do indivíduo.

É na formação da personalidade do homem, lá na tenra infância, onde está a violência “ab initio”, o ovo da serpente. Numa família desestruturada, pais que não assumem a postura de educadores, que não têm coragem de dizer “não” para combater as más tendências, estão moldando o transgressor de amanhã. Não se pode combater a violência somente com ações punitivas e repressivas como o aumento de efetivos policiais, a construção de presídios, desarmamento, diminuição das desigualdades ou reforma do judiciário. São necessárias ações preventivas, do engajamento da sociedade como um todo, dos pais, familiares, professores, governantes, das religiões; ora, que todos se façam presentes na educação e formação das crianças, mostrando-lhes o caminho da civilidade, da urbanidade, da alteridade e do respeito ao próximo. Sem isso, ainda vamos chorar por muitos anos por um mundo melhor, porque este em que vivemos ainda vai piorar muito. Pensem nisso.

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